O Rato Humano (Quella villa in fondo al parco, 1988)

Em uma tarde chuvosa, quando eu ainda era uma criança saudável e tranquila, resolvi sair para alugar uma fita. Ao chegar a locadora, deparei-me com um título na prateleira que atraiu minha atenção. A capa dizia: "não recomendável para pessoas impressionáveis". Uau! A fita estava um tanto empoeirada, é verdade, há muito esquecida entre tantas outras que ninguém mais alugava. Nem mesmo o atendente sabia de que o filme tratava. Ora, com todo aquele mistério envolvendo a película, seria, no mínimo, irresponsabilidade minha não levá-la para casa a fim de conferir. E foi o que eu fiz. Enfiei a fita no vídeo-cassete, joguei-me no sofá e comecei a ver O Rato Humano.

O longa era tão tosco, tão tosco, que, mesmo anos depois, detalhes não saíam da minha cabeça. Então, a tecnologia avançou e, graças à internet, consegui encontrar uma cópia com áudio em inglês e legendas em algum idioma asiático (assim, você já pode ter uma idéia de como é difícil encontrar essa porcaria). Assisti ao filme novamente e, após me mijar de rir com essa pérola classe B, parei e pensei que seria uma boa idéia tentar ressucitar o blog com um artigo sobre ele. Não que vá adiantar alguma coisa, uma vez que só umas duas pessoas devem ler as besteiras que escrevo (e olha que estou sendo generoso!), mas, pelo menos, fica a sensação de dever cumprido pela divulgação dessa bomba.

Fale a verdade: você já está se roendo (sem trocadilho!) de curiosidade para saber o que há de tão impressionante em O Rato Humano, né? Obviamente, é difícil esperar algo que preste de um título podre como esse e, como se não bastasse, o diretor Giuliano Carnimeo (escondido sob o pseudônimo Anthony Ascot), de westerns spaghetti como Eu Sou Sartana, conduz o longa como se este fosse um filmaço de horror digno do Cinema italiano da década de 80. Porém, me adianto. Melhor começar pelo começo (duh!).

O Rato Humano tem início na República Dominicana, com a narração em off de um cientista que desenvolveu um híbrido a partir de DNAs de um rato e de um macaco com o objetivo de ganhar o prêmio Nobel. Certo, não me perguntem qual o benefício que uma criatura dessas traria à humanidade, mas o mané achou que seria uma obra de gênio. Entretanto, a experiência de fundo de quintal resultou em um monstro violento e venenoso: um único arranhão seria capaz de exterminar suas vítimas com "leptospirose instantânea" (HAHAHA!). Certa noite, às vésperas de uma conferência em que o idiota apresentaria sua criação ao mundo, o híbrido foge de sua gaiola, espalhando morte na pacata vila de San Martin (sentiu o clima?).

Pausa! Antes de seguir em frente, gostaria de esclarecer um detalhe: o tal monstro violento e venenoso tem apenas 72cm (!!!) de altura e é interpretado por ninguém menos que Nelson de la Rosa, o menor ator do mundo, falecido em 2006 aos 38 anos. Agora, imagine uma criatura magricela de 72cm tocando o terror em uma população inteira. Er...

Continuando! Corta para uma praia, onde o fotógrafo Mark (Werner Pochath) está realizando um ensaio com duas aspirantes a modelo, Marlis (a gostosíssima Eva Grimaldi) e Peggy (Luisa Menon, em seu único filme). Enquanto Mark faz um trabalho de porco (é ver para crer...), um cidadão observa as gostosas de longe, escondido no mato, e se torna a primeira vítima de Nelson do monstro em uma cena ridícula. O ataque ocorre off-screen, tudo o que vemos é o figurante com cara de quem está com dor-de-barriga e um filete de ketchup no pescoço, Nelson o monstro pendurado em suas costas. Enfim, as fotos continuam rolando até Marlis avistar um crânio de plástico vagabundo entre umas pedras. Apesar de assustado, o trio decide não ir à polícia e retorna para o hotel.

Cai a noite e Peggy pede um vestido emprestado a Marlis e sai para um encontro. Tudo parecia bem até o pneu do táxi que a conduzia furar em uma região deserta e absurdamente escura da cidade. Infelizmente, o motorista não possui um estepe, visto que era o terceiro (!!!) pneu furado naquele dia, e a única saída da moça é caminhar até um ponto de ônibus a 100m dali. No meio do caminho, Peggy ouve um som estranho que escapa de uma das residências e decide dar uma espiada, alcançando a janela bem a tempo de ver o corpo ensanguentado de uma coroa ser arrastado pelo piso. Subitamente, um gorducho surge sabe-se lá de onde e começa a persegui-la com uma faca na mão. É interessante ressaltar que, enquanto Peggy corre desesperadamente pela rua, o maníaco a segue em passos de formiga, sem o menor empenho, a la Jason Vorhees. Aliás, para mostrar o quanto o cara é sinistro, Carnimeo dá um close nas mãos do sujeito, que picota o sapato que Peggy deixa para trás. Que medo!

Bem, se você não nasceu ontem, sabe que esse assassino psicótico e sádico, que não poupa nem mesmo um pobre sapato, entra em cena somente para assustar Peggy, de modo que ela faça algo estúpido e caia nas mãos de Nelson do monstro! Do monstro! Agora, coloque-se no lugar da imbecil coitada: você está em um bairro completamente deserto, com quilômetros de rua a sua disposição para fugir. Sendo assim, você simplesmente correria como louco(a) até encontrar ajuda, certo? Errado! Não seja idiota! É muito mais prático invadir uma casa abandonada e se esconder dentro de um armário velho, torcendo para que o homem não descubra seu esconderijo. O plano quase dá certo, não fosse o colar de Peggy arrebentar de repente e as pérolas fazerem o maior barulho ao tocar o chão, chamando a atenção do psicopata. Porém, o cara sequer tem tempo para concretizar seu ataque, já que Peggy mete o pé na cara do rato-humano, escondido sob uma pilha de roupas, e morre violentamente.


Segunda vítima despachada, entram em cena os inúteis heróis, o escritor Fred Williams (o canastrão David Warbeck, que estrelou diversos filmes italianos e trabalhou com Lucio Fulci em The Beyond) e Terry (Janet Agren, de Pavor na Cidade dos Zumbis, também de Fulci, e Os Vivos Serão Devorados), irmã de Marlis (lembram dela?), que voou até a Rapública Dominicana após receber a notícia de sua morte. Os dois, apesar de não se conhecerem, dividem um táxi na saída do aeroporto. Terry conta, impassível, que precisa ir ao necrotério identificar o corpo da irmã e Fred mostra ser um homem extremamente inconveniente, convidando-se para acompanhá-la. Acontece que, como bem sabemos, Marlis não está morta. O cadáver é de sua amiga Peggy e o inspetor que investiga o crime demonstra ser um completo idiota, pois deduziu que a moça seria Marlis devido apenas à cor dos cabelos (tanto Peggy quanto Marlis são loiras) e pelo vestido emprestado que ela usava na ocasião. Sequer lhe passou pela cabeça procurar os documentos da vítima ou, na falta deles, checar as impressões digitais e buscar informações no hotel, afinal, se ele sabia da existência de uma, não tinha como não saber da outra! Não sei quanto a você, mas eu ficaria puto da vida! Terry tem um rápido bate-boca com a polícia, Fred dá um esporro básico no inspetor e os dois vão embora. Em seguida, descobrem que Marlis e sua equipe estão desaparecidos há três dias, desde que seguiram para a selva a fim de fotografar. Após uma breve conversa na piscina do hotel, em que Fred aparece de sunga e... sapatos (!!!), o escritor arrasta Terry para a cena do crime, onde pretende usar sua imaginação para reconstituir o que realmente aconteceu na noite do assassinato.

Durante a reconstituição, Carnimeo brinda o espectador com um susto falso vergonhoso. Você, certamente, já viu um sem-número de vezes situações em que os protagonistas escutam um ruído e, ao investigarem, são surpreendidos por um gato. Esse mesmo artifício é empregado aqui, no entanto, é possível notar que algum contra-regra esteve segurando o animal o tempo todo e, assim que os atores se aproximaram, simplesmente arremessou o bicho na direção deles de qualquer jeito (HAHAHA!). Enfim, Fred também informa que Peggy não morreu devido ao ataque, mas sim de ataque cardíaco (leptospirose instantânea?) e lança o mistério no ar.

Enquanto isso, na selva (leia-se: um parque com trilhas pavimentadas, grades de contenção, etc.), Peggy e sua equipe, formada por Mark e uma mulher chamada Monique, realizam um ensaio fotográfico para lá de esquisito. A razão pela qual o trio ficou afastado da cidade por tanto tempo jamais é explicada, visto que não interessa. Não demora muito para que os três sejam surpreendidos por outro cadáver, fugindo para a vila mais próxima em busca de ajuda. A cidade, porém, está deserta e o espectador, próximo do clímax do filme, em que o impiedoso minimonstro matará geral, começando por Monique, que só dá as caras no longa para virar comida de rato.

Creio que minha descrição até aqui tenha sido o suficiente para você perceber a merda maravilha que é essa película. O responsável pela trama é Dardano Sacchetti (sob seu pseudônimo habitual, David Parker Jr.) que, convenhamos, a despeito de não possuir uma carreira das mais brilhantes, escreveu bons roteiros como os de Demons e A Catedral, ambos de Lamberto Bava. Em O Rato Humano, Sacchetti apela para diálogos imbecis e situações absurdas, além de buscar a todo custo que o espectador engula que Nelson de la Rosa em trapos, garras e dentadura seja uma criatura genuinamente ameaçadora (se fosse um mestre Splinter cheio das manhas do kung fu, quem sabe...). Quando Monique é atacada dentro de um quarto, por exemplo, Mark e Marlis correm para ajudá-la. Marlis pretende entrar com ele, no entanto, o fotógrafo dá esporro: "Esqueça! Aqui fora é muito mais seguro!", esquecendo que os três estão em uma casa abandonada em uma vila deserta. Devo ser mesmo muito burro, uma vez que seria capaz de jurar que deixar a moça sozinha do lado de fora não seria a melhor opção. Em outro momento, Marlis se torna a única sobrevivente do massacre e tenta usar uma caminhonete para fugir, sendo surpreendida pelo rato-humano. Vejam só, ao invés de correr pela estrada, dar um bico na cabeça do monstro, cuspir nele, sei lá, a retardada corre para dentro da casa e se tranca na cozinha!

Ah, e antes que eu me esqueça, para que desenvolver os personagens se, em um rápido diálogo, ficamos sabendo que Terry tem 29 anos, mora com o pai em Washington e sua irmã Marlis é a ovelha negra da família? Aliás, a relação entre Fred e Marlis é a coisa mais esquisita que já presenciei: os dois se encontram por acaso e ficam juntos o resto do filme como se fossem grandes amigos. Eu, hein...

Agora, voltemos à direção de Giuliano Carnimeo, comentada no 3º parágrafo desse artigo. Bem... é péssima! Carnimeo tenta imitar na cara-dura alguns planos típicos de Lucio Fulci, como closes nos olhos ou no rosto de vítimas apavoradas, e ainda insere o mesmo superclose ridículo em um único olho (!!!) do monstro umas 387 vezes ao longo do filme a fim de criar suspense, porém o resultado é risível. Os ataques da criatura são constrangedores, resumindo-se a de la Rosa sobre o bobo da vez, sacudindo os braços pequeninos de qualquer maneira. Consigo até imaginar Carnimeo ligando a câmera e pedindo ao ator que imite um rato-humano assassino. A trilha sonora de Stefano Mainetti (do infame Zombi 3) também não ajuda. Além de tocar a todo instante, destrói qualquer clima que o diretor poderia estabelecer, pois simplesmente não encaixa na atmosfera de um filme de horror.

Diante disso, a constatação que fica é que O Rato Humano é aquele filme perfeito para ser visto com os amigos, de preferência com o pote cheio. Ainda há uma cena de nudez totalmente gratuita de Eva Grimaldi, que Giuliano Carnimeo procurar enquadrar de todos os ângulos possíveis. Portanto, providencie a cerveja, junte a galera e divirta-se. Ou morra de medo... HAHAHA!


O Rato Humano (Quella villa in fondo al parco, Itália, 1988)

Duração: 82 minutos

Diretor: Giuliano Carnimeo

Argumento: Dardano Sacchetti; roteiro: Dardano Sacchetti

Edição: Vincenzo Tomassi;
fotografia: Roberto Girometti

Música: Stefano Mainetti

Elenco: David Warbeck (Fred Williams); Janet Agren (Terry); Eva Grimaldi (Marlis); Luisa Menon (Peggy); Werner Pochath (Mark); Nelson de la Rosa (Rato-Humano); Anna Silvia Grullon; Pepito Guerra; Victor Pujols; Franklin Dominguez

1 Manifeste-se!:

Anônimo 10 de maio de 2009 às 22:46  

Hey, tks por passar lá no blog!
E ADOREI seu template! Super legal!

Ah, como vc faz pra colocar esse "traço" em cima da palavra? Eu escrevo no outlook (e lá eu formato a fonte e coloco o "traço") e mando o post por email pro blog, mas dá mto trabalho... eu queria uma maneira mais fácil... vc sabe?

Tentei fazer isso só usando o word e colando no blog, mas dá erro de HTML =/

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Sobre Esta Coisa

Espaço de um estudante de Literatura completamente sem noção e apaixonado por Cinema.

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Órfão desde que sua mãe o abandonou, aos 2 anos, e seu pai, morto em uma tentativa de assalto, Miguel Bittencourt não se deixou abater pelas dificuldades da vida e se tornou um escritor de sucesso. Em uma madrugada, após comemorar o término de seu quarto romance, acabou salvando, de maneira um tanto desajeitada, uma moça que jamais havia visto antes de um possível estupro. Agora, seu corpo está passando por mudanças extraordinárias e os homens responsáveis pelo ataque o estão acompanhando de perto, com uma história absurda sobre uma trégua secular entre criaturas fantásticas e sanguinárias. Aparentemente, sua família há muito esquecida é o centro disso tudo e, agora, Miguel tem nas mãos a chance de uma vingança inusitada. www.leiadanielcoelho.com.br